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Adaptações à dinâmica do tráfico de escravos e questões étnicas e comunitárias em São Francisco do Conde, BA (1811-1854)


Carlos Alberto Medeiros Lima
(UFPR / CNPq)

Curitiba, 2017

Resumo: Neste artigo são abordados aspectos da dinâmica do tráfico de escravos e da posse de cativos, das mudanças na produção açucareira, da composição étnica da sociedade local, da dinâmica da mestiçagem e da família escrava em São Francisco do Conde, Bahia, durante a primeira metade do século XIX. Os registros de óbito são as principais fontes de informação.
Palavras chave: escravidão – tráfico de escravos – Bahia, século XIX – mestiçagem – família escrava – lavoura canavieira

Adaptations to the dynamics of the slave trade and ethnic and communitarian issues at São Francisco do Conde, Bahia (1811-1854)

Abstract: The article deals with aspects of the dynamics of the arrival of Africans, of patterns of slaveholding, of changes in sugar production, of the ethnic composition of local society, of the dynamics of miscegenation, and of slave family at São Francisco do Conde, Bahia, during the first half of the nineteenth century. Burial records are the main sources.
Keywords: slavey – slave trade – Bahia, XIXth century – miscegenation – slave family – sugar production


Adaptaciones a la dinámica del tráfico de esclavos y cuestiones étnicas y comunitarias en São Francisco do Conde, Bahia (1811-1854)

Resumen: En este artículo se examinan aspectos de la dinámica de las llegadas de africanos, de la distribución de la propiedad de esclavos, de las mudanzas en los procesos productivos del azúcar, de la composición étnica de la sociedad, de la dinámica del mestizaje y de la familia esclava en São Francisco do Conde, Bahia, a lo largo de la primera mitad del siglo XIX. Registros de defunciones constituyen las principales fuentes de información.
Palabras clave: esclavitud – tráfico de esclavos – Bahia, siglo XIX – mestizaje – familia esclava – producción azucarera

Introdução
            Neste artigo abordam-se os problemas vinculados ao impacto da ilegalidade do tráfico de escravos africanos e a aspectos das sociabilidades escravas durante a primeira metade do século XIX, em duas paróquias da vila de São Francisco do Conde, no norte do Recôncavo Baiano. Trata-se das de São Gonçalo e Nossa Senhora do Monte do Recôncavo – provavelmente as duas mais importantes da vila no tocante a concentrar engenhos e elites, conforme informação produzida durante o século XVIII (PEDREIRA, 1984, p. 18). Uma medida da importância dessas duas freguesias pode ser buscada no Recenseamento de 1872: São Francisco continha, então, mais de quarenta mil pessoas vivendo fora da escravidão, abarcando 0,4% de toda a população brasileira.[1]
            O movimento dos desembarques de africanos é bem conhecido a partir dos trabalhos de David Eltis e equipe. [2] Ele mostra, a partir de 1801, a chegada do auge da importação de africanos no Brasil. Na Bahia, desse ano até 1810, 102 mil escravos. De 1811 até 1820, mais de 115 mil, e de 1821 a 1830, quase 98 mil, em virtude, ali, dos distúrbios da Independência, embora no país como um todo este fosse o auge histórico. A primeira proibição teve efeitos, baixando o total de desembarcados para menos de 35 mil em 1831-1840, mas houve retomada, embora pouco sustentada, com 65 mil em 1841-1850. A isso se seguiu a supressão efetiva do comércio de africanos.
            Por si sós, essas estimativas fazem referência à persistência das importações de africanos, mas também ao impacto efetivo da proibição sobre elas, demandando pesquisas para por um sinal de expansão ou crise nesses movimentos. Este trabalho faz parte de um esforço mais amplo para indicar que muitas das mudanças no cativeiro normalmente associadas à segunda metade do século XIX podem ter começado a ocorrer já antes disso. Isso se teria exprimido em alterações nos preços de escravos, na concentração de sua posse e na decadência da politicamente fundamental camada de pequenos proprietários de cativos. Tudo isso ganharia ímpeto a partir da proibição efetiva do tráfico de 1850, mas é importante avaliar os primeiros momentos desses processos, inclusive investigando seu impacto nas sociabilidades, pois, se as grandes mudanças posteriores a 1850 ocorreram em meio a uma relativa solidificação institucional da monarquia brasileira, as alterações menos dramáticas do intervalo 1830-1850 se deram, inversamente, em época de aguda instabilidade política. A possível concentração da posse de escravos, ainda antes da proibição definitiva de 1850, deve ter introduzido já nessa época fatores de crise nos processos de sustentação política do cativeiro, embora não tenham tido o mesmo alcance que as mudanças causadas pelo fim definitivo do comércio de almas.
            Paralelamente, e por razões diferentes, os negócios do açúcar receberam efeitos muito negativos da recessão atlântica do segundo quarto do século e, ao redor de 1840, da competição cubana. Isso cria interesse nos efeitos das transformações causadas pelo mercado de escravos em um ambiente marcada por esses destinos do produto.
            Além disso, a vida dos escravos foi impactada por uma outra modificação na história do açúcar baiano. O século XIX inaugurou a expansão, nos antigos engenhos do local e em muitas unidades novas montadas exatamente no período, das formas caribenhas, em oposição aos mecanismos produtivos tradicionais na região, conhecendo-se a brutalidade e o ritmo bem mais alucinante da produção açucareira das Antilhas, em confronto com o “negócio nobre” da Bahia (SCHWARTZ, 1988, p. 77ss).
É importante por lado a lado discussões sobre o tráfico ilegal e sobre as sociabilidades escravas, abordadas estas por intermédio de informações acerca da vida familiar. Isso se deve a ter-se tratado de época de grande instabilidade, e não só no tocante ao comércio de africanos. Havia as questões propriamente baianas, de grande conturbação política ligada à escravidão (REIS, 1992, p. 107). Havia também questões políticas articuladas à Independência e à situação pós-colonial na Bahia (REIS; SILVA, 1989, cap. 5; SOUZA, 1987; MORTON, 1975, p. 250). Intervinham, mais amplamente, os dilemas pós-coloniais do país como um todo, expressos especialmente nas rebeliões regenciais. O problema do acesso à terra também passara a ser fonte de conturbação, com a interrupção da concessão de sesmarias em 1822 (SMITH, 1990, p. 304; MOTTA, 1998), o que suprimiu boa parte da arbitragem estatal quanto à propriedade, e isso em uma época durante a qual a população livre estava provavelmente passando a crescer mais consistentemente, além do fato de se terem suprimido amarras coloniais para a expansão na direção de fronteiras agrárias. Se não no Recôncavo, em virtude da antiguidade de sua ocupação, pelo menos no império em seu conjunto e nas instituições vigentes (inclusive na Bahia), esse fator de difusão da violência pode ter tido um papel importante. Essa espécie de tempestade perfeita pós-colonial torna decisivo o estudo das sociabilidades no período.
            Restrições à abertura de novos engenhos vinham sendo suprimidas desde a Independência,[3] e Schwartz chamou a atenção para a proliferação de engenhos novos na Bahia, antes mesmo da emancipação política. Seu número cresceu quase constantemente até 1822, apesar de alguma tendência à redução da escala dessas unidades novas (SCHWARTZ, 1988, p. 150, 172, 228, 344-345). Isso teve relação com o expansionismo do período, mas também com o fato de que um engenho dessa época não se confundia mais com as enormes unidades coloniais produtoras de açúcar branco. Exportar açúcar, na época, tornara-se atividade mais caribenha que baiana, no sentido de que unidades menores produzindo açúcar bruto passavam a ser mais adequadas que os aristocráticos e gigantescos engenhos produtores de menor quantidade de açúcar branco (BARICKMAN, 2003, p. 78-79). Ressalte-se que o tom de modernização impresso a esse relato parcial das mudanças na atividade canavieira baiana não significa identificar ali transformações como as que se operavam mais ou menos na mesma época em Cuba, com a proliferação de seus enormes engenhos mecanizados.[4] Tudo caminhava para parecer-se mais com o Caribe inglês ou francês do século XVIII que com a Cuba do oitocentos. Assim, apareciam em 1838 anúncios como o publicado por Antonio Joaquim Calmon Villas-boas, que vendia “a propriedade de engenho de fazer assucar, que possue, livre e desembargada”, em Santo Amaro. A unidade fora “edificada a dous annos”, em “terreno próprio, todo de massapé de boa qualidade. Vendia “com alguns escravos e bois, ou mesmo sem elles”.[5] É possível que se tratasse de uma relação inteiramente nova, para os baianos, com a posse de engenhos. É difícil imaginar gente do “negócio nobre” colocando anúncios de jornal dessa ligeireza, apesar de Schwartz às vezes enfatizar que a rotatividade da propriedade de engenhos era, mesmo na Bahia colonial, maior do que já se imaginou (SCHWARTZ, 2014, p. 359). Além disso, o anúncio sugere que esse novo engenho devia ser pequeno em comparação com as enormes unidades coloniais. Manter esses deslocamentos em mente ajudará a entender os desempenhos bem diferentes de São Gonçalo e de Nossa Senhora do Monte.
            Como em modelos usados por historiadores nos últimos tempos (TOMICH, 2011, p. 83; MARQUESE, 2008), unidades novas formavam-se velozmente e voltavam-se para a produção de matérias primas.[6] Mas alguns elementos derivados do fato de se tratar de área de antiga ocupação, na verdade quinhentista, retinham importância. A freguesia onde o cativeiro mais se aprofundou durante o período estudado, Nossa Senhora do Monte, não constituía, então, uma área nova, até o momento deixada marginalizada. A freguesia fora fundada em 1608, e engenhos locais já eram mencionados por Gabriel Soares de Sousa, no final do século XVI (PEDREIRA, 1984, p. 27). Assim, mais que a expansão da fronteira, o que se entrevê é uma onda de expansão disruptiva varrendo terras antigas. O modelo faz referência a formas mais pesadas de gestão das escravarias (TOMICH, 2011, p. 114), o que de certa forma encontrará paralelos nos resultados deste estudo. Mas, além de terem sido comparativamente duras as condições dos escravos desde muito antes, é inegável que a concepção de que estaria em construção uma nova estrutura não combina com um argumento central deste trabalho: gestava-se um fator de crise na escravidão; a disparidade de condições minaria as bases de sustentação política do cativeiro.
            O fato de essa onda ter varrido terras antigas demanda reflexão sobre os aspectos processuais. Desde que começou a levar em conta a tessitura de laços comunitários entre os escravos, a historiografia da escravidão passou a considerar a relevância da história específica das comunidades e regiões, problematizando os contextos. Gutman chamou a atenção para a temporalidade intrínseca à convivência dos cativos no interior de cada uma das escravarias, criando uma espécie de ciclo que levava a laços mais intensos na maturidade do plantel e à desarticulação no instante da morte dos proprietários (GUTMAN, 1976, p. 138). Percepção diversa deriva das obras de Craton e Gutman a respeito do Caribe Inglês. O processo, para eles, passava por um momento inicial da região em que a alta proporção de homens entre os africanos tornava impossíveis as famílias extensas, impondo uma quase conjugalidade europeia. O relativo envelhecimento da região enquanto área produtiva reduzia a parcela africana da população cativa, além de diminuir o ritmo de crescimento econômico. Isso minimizava os aportes de africanos, criando, assim, condições para uma maior parcela feminina na população e para o aprofundamento genealógico dos laços, abrindo caminho para a família poligínica (CRATON, 1979; HIGMAN, 1975). Diferentemente do tempo da escravaria de Gutman, trata-se nesse caso do tempo da região. Mais recentemente, têm impactado as percepções processuais as análises de Berlin, para quem o acento deve ser posto no processo de consolidação da classe senhorial no terreno da atividade principal. O início do povoamento implicava a presença de poucos escravos, boa parte dos quais “crioulos atlânticos”, com muita interação com os pobres livres dos arredores. A acumulação obtida pela classe senhorial permitiria, com o tempo, nova “geração”, marcada pela aquisição maciça de africanos recém-saídos de suas sociedades de origem. Trancafiados em senzalas, ficavam aprisionados em relações (distantes) com o poder senhorial, que no processo se definia. Eram afastados das relações de sociabilidade com os livres pobres e, em virtude da nova forma de existência, ao mesmo tempo grupal e isolada, definiam-se ao redor da “África”, mas também da “raça”. Posteriormente, chegava o momento dos deslocamentos para as fronteiras agrárias do século XIX, conducente a separações e mais migrações forçadas (BERLIN, 2006).
            Além de modelos que enfatizam fenômenos globais, como o de Tomich, e daqueles de matriz processual, é preciso deixar a análise dos dados ser bafejada por uma percepção, também crítica, de que se estaria diante das chamadas sociedades do açúcar.[7] Essa concepção chama a atenção para a rigidez da atividade canavieira, associada às economias de escala, à brutalidade dos processos de trabalho, à alta insalubridade e às dificuldades de financiamento e relacionamento com o capital mercantil.
            O modelo de Tomich auxiliará a mensurar a relevância de uma nova expansão no fim do século XVIII e início do seguinte, mas terá que ser calibrado pela percepção de se terem instalado fatores de crise. O processual dirige a atenção para o acúmulo de laços e de oportunidades para a criação de novos laços e grupos sociais, mas será necessário levar em conta que efeitos importantes dos processos cumulativos foram simplesmente reprimidos pelas condições locais. A especificidade canavieira ajuda a compreender que a expansão estudada se deu, em grande medida, “à velha moda”, mas o final do artigo contém avaliações no sentido de terem sido muito diferentes as características de outras áreas de expansão da cana no Brasil da mesma época, calibrando a incidência das explicações pela via da lógica do próprio açúcar.
A principal fonte de informação é constituída pelos registros de óbitos, impondo realizar uma breve reflexão metodológica sobre o uso desse tipo de assento na pesquisa. É óbvio constituir um problema o fato de se buscar entender a vida social observando informações sobre quem estava deixando de existir, pois o tamanho de sua presença nos óbitos podia apontar mais para o desaparecimento de um grupo que para seu peso específico. No entanto, também é evidente que essas pessoas estavam vivas até o momento anterior, compondo a população. A questão é que, se for ampliado o intervalo observado, os registros de óbito acabam constituindo testemunho a respeito da composição da população em termos de estatuto social, condição jurídica, etnicidade e gênero, mostrando tendências dessa composição, embora nunca valores absolutos. É condição para aproveitar-se disso considerar que o ritmo das mortes variava segundo os grupos sociais, etários e étnicos, distorcendo em alguma medida a imagem obtida sobre a composição. À consideração das distorções causadas pela mortalidade diferencial deve ser acrescentada a expectativa de que também incidisse sub-registro diferencial, ao longo de linhas semelhantes, mas com sentido inverso. Essas distorções só não serão graves se forem levadas em conta na interpretação dos dados.
            As condições novas instauradas na região ajudam a compreender aquilo que se visualiza ao se compararem indícios relativos à posse de escravos nas duas paróquias.
A estagnação de São Gonçalo e o avanço em N. S. do Monte
            Alguns aspectos dos dilemas do enfrentamento pelos escravistas das circunstâncias para eles já adversas da época da primeira ilegalidade do tráfico africano ficam evidenciados através de aproximações ao tamanho das escravarias e à dinâmica da posse de escravos nas duas paróquias. Isso pode ser feito por intermédio dos próprios óbitos, desde que nos contentemos com uma aproximação que, além de não permitir nenhuma achega ao tamanho efetivo dos plantéis, não faculta definir com precisão a participação dos senhores de escravos na população.
            Observa-se a quantidade de senhores que sepultavam escravos nas freguesias, a cada ano, assim como a quantidade média de escravos sepultados anualmente pelos mesmos. A evolução do número médio de escravos enterrados por proprietário indica se a robustez das escravarias locais estava aumentando ou diminuindo. A evolução do número de proprietários que a cada ano sepultava escravos indica se a posse de escravos estava ou não se concentrando socialmente. Só interessam as comparações entre os volumes das duas freguesias e o movimento dos dados dentro de cada uma delas. Não há modo de arrancar dos óbitos indicadores que permitam entrever fenômenos compreendidos de forma absoluta. O número anual de senhores que sepultaram escravos a cada ano está plotado como média móvel de três anos (gráficos 1 e 2).
Durante o auge do tráfico de escravos africanos para o Brasil – os anos 1820 –, a quantidade de senhores a aparecer nos registros de óbitos de São Gonçalo começou a decrescer. A média de escravos sepultados ao ano por senhor – nosso indicador acerca do tamanho das escravarias – também passou a cair. Mas como a média anual reduzia-se de modo muito menos expressivo que o verificado em relação à quantidade de senhores, esse desempenho só pôde ter sido obtido através da concentração da posse de escravos. O trajeto na época dos contrabandos teve um sinal um tanto negativo e, acrescente-se, esse sinal se fez acompanhar de um robustecimento da desigualdade entre os proprietários, ou entre os homens livres de modo geral. Já em Nossa Senhora do Monte, como se passa a ver, o sinal foi positivo para os escravistas.
            Segundo o gráfico 2, além de o número médio de óbitos por senhor ter ultrapassado o de São Gonçalo, é notável que ele tenha aproximadamente dobrado ao longo dos cerca de trinta anos pesquisados. Assim, apareceu em N. S. do Monte uma profusão impressionante de barões. Anotaram-se mais de 140 falecimentos de escravos do Barão de Paraguassu, mais de 40 do Barão de São Francisco e mais de 180 do Barão do Rio de Contas, além dos mais de 170 óbitos de escravos de Francisco Vicente Viana, filho do Barão do Rio de Contas e depois Barão de Viana. Foi nessa freguesia que viveu o final de sua vida o ilustrado Luís Antônio de Oliveira Mendes, pois faleceu, com prováveis noventa anos de idade, segundo o religioso que lavrou o registro, em 15 de julho de 1838 (Monte do Recôncavo, O., 1845-1852, fl 31).
Gráfico 1


Fontes: Paróquia da Vila de São Francisco, óbitos, 1810-1849 (doravante, SG-1810-1849); Livro dos óbitos da freg.a da Villa de S. Francisco, 1849-1877 (doravante, SG-1849-1877).
Paralelamente, a quantidade de senhores que aparecia a cada ano nos registros, após ter aumentado bastante até 1837 ou 1838, estabilizou-se a partir de então. Em outras palavras, o indicador do tamanho médio das escravarias cresceu quase sempre, se descontarmos os picos (certamente traficantes) de 1837 e 1842; mas a quantidade de senhores parou de aumentar por volta da metade do período. Assim, especialmente no final do intervalo observado, os plantéis de N. S. do Monte aumentaram de tamanho enquanto diminuíam de número. A desigualdade da posse de escravos e a distância frente aos livres não escravistas cresceu também aí.
            A disparidade de patrimônios escravistas em São Francisco também pode ser observada comparando as duas freguesias. Em uma delas houve estagnação; na outra, crescimento, e essa maior distância social entre os senhores das duas constitui outra forma de perceber o aumento da desigualdade entre os escravistas. A primeira proibição do tráfico teve importância no sentido de gerar fatores de crise, e essa problematização de fatores de unidade da classe senhorial prometia mais crise no futuro.
Gráfico 2

Fontes: Monte do Recôncavo, O., 1821-1852 (daqui para a frente, MO-1821-1852); Monte do Recôncavo, O., 1852-1862 (doravante, MO-1852-1862).
            É crucial notar que, a pesar do crescimento impressionante de sua relação com a escravidão, os indicadores quanto a N. S. do Monte frearam pouco antes de 1840, o que impõe refletir sobre o mercado de açúcar. Foi ao redor de 1840 que a ascensão cubana, em meio à recessão atlântica, mostrou todos os seus efeitos.
A sociedade local
            Os registros de óbito das duas paróquias têm informações singularmente completas sobre os livres e libertos que nelas faleciam, pois quase invariavelmente atribuíam-lhes uma cor e uma condição jurídica. Há alguns problemas, no entanto, ao lado do conhecido sub-registro. Um deles é o de que o significado da palavra “forro” oscilava, às vezes significando “liberto”, mas às vezes fazendo referência aos bem mais numerosos descendentes livres de escravos. A definição do status conjugal dos livres adultos e da legitimidade/ilegitimidade da filiação das crianças livres também aparecem com regularidade. Quanto aos escravos, idade e vínculos familiares eram referidos com menos frequência nos registros. Era, no entanto, comparativamente muito grande a propensão a comunicar procedências.
            Essas informações básicas permitem avaliar alguns aspectos importantes da escravidão em São Francisco do Conde (tabela 1). A participação escrava na população é um deles. Outro é constituído pela relação com o tráfico de escravos e com as grandes áreas de embarque de africanos. Outro ainda se liga à maturação de regiões escravistas. A antiguidade do povoamento escravista e a centralidade do cativeiro se exprimiam geralmente na importância da parcela crioula do contingente cativo, na proporção de “pardos” e “cabras” entre os escravos e na presença de uma robusta camada de descendentes livres de escravos. Os assentos de sepultamento permitem verificar isso, desde que se levem em conta os dois fenômenos que, com sentidos inversos, deturpam os dados: a mortalidade diferencial conforme os grupos sociais, que inflaciona a quantidade de pobres, negros livres e escravos nos registros, e o sub-registro também diferencial conforme a posição social, que tem sentido inverso.
            Nessa aproximação aos estratos da população de cada paróquia, fica evidente a presença majoritária de descendentes livres ou libertos de escravos. A mortalidade diferencial não poderia explicar sua preponderância nas fontes. Isso mostra que a antiguidade do povoamento tinha impacto na estruturação das condições locais. Só ela pode ter permitido, na ausência de fortes processos de migração de ex-escravos libertados em outras partes, a lenta acumulação de uma população livre originária de alforrias. Ressalta-se tal circunstância neste momento porque, como se verá no correr deste trabalho, a família escrava não dava muitos sinais de extensão, aprofundamento ou, no mínimo, de reconhecimento, e esses sinais seriam de se esperar em local tão marcado por uma longa história de maturação. Isso será abordado adiante.


Tabela 1
Aproximação aos grupos constitutivos da população de São Gonçalo (1811-1854) e de Nossa Senhora do Monte (1822-1854) – percentagens do total de óbitos

São Gonçalo,
1811-1854
N. S. do Monte,
1822-1854
Brancos
22,5
16,5
Total dos
aparentemente
considerados brancos


22,5


16,5
Forros sem qualificação
-
0,1
Pardos forros
10,4
2,9
Cabras forros
2,5
1,1
Mestiços forros
-
0,1
Crioulos forros
5,1
3,0
Pretos forros
0,2
0,2
Africanos forros
3,8
0,4
Pardos “libertos”
0,1
0,5
Cabras “libertos”
-
0,1
Crioulos “libertos”
-
1,0
Africanos “libertos”
-
1,1
“Libertos” s/ cor ou proced.
-
0,1
Pardos livres ou s/ cond.
9,3
17,8
Cabras livres ou s/ cond.
2,2
2,9
Mestiços livres ou s/ cond.
-
0,2
Não brancos s/ inf.*
6,4
0,4
Crioulos livres ou s/ cond.
2,0
3,0
Pretos livres ou s/ cond.
0,1
-
Total de libertos e descendentes livres de escravos


42,2


34,7
Escravos pardos
2,8
2,3
Escravo cabras
3,0
2,3
Escravos crioulos
10,1
15,4
Escravos s/ qualificação
2,8
4,4
Escravos pretos
0,1
1,0
Escravos africanos
16,3
23,4


Total de escravos


35,2


48,8
Outros**
0,1
-



Total geral
(n. absoluto)



100
(2920)



100
(2697)
* Sabe-se pela filiação que não seriam considerados brancos.
** Duas pessoas de origem Roma, designadas como “ciganos”.
Fontes: SG-1810-1849; SG-1849-1877; MO-1821-1852; MO-1852-1862.
            Voltando, no entanto, à distribuição dos livres quanto a sua cor, um número eloquente é o de aparentemente brancos confrontados com descendentes livres e libertos de escravos. Nas duas freguesias, essa relação era, nos óbitos, de um possível branco para cada dois do outro conjunto. Os classificáveis como brancos eram um pouco mais importantes na população livre de N. S. do Monte, como se viu a de dependência mais crescente da escravidão (40% dos não escravos, enquanto em São Gonçalo eles eram um terço do total de livres e libertos).
            Quanto aos escravos, sua participação na população era bem maior em N. S. do Monte. A africanidade era nesta era ligeiramente maior, alcançando metade, mas o número relativo a São Gonçalo era muito parecido. A importância dos classificados como pardos ou cabras era maior na freguesia da vila, chegando a um sexto dos escravos, enquanto na outra paróquia ela ficava ao redor de um décimo. Os classificados como crioulos ou deixados sem qualificação eram dois quintos do total em ambas, com uma vantagem ligeira, provavelmente insignificante, em N. S. do Monte.
            A questão dos pardos e cabras entre os escravos levanta problemas importantes. O amadurecimento da área significava aumento de sua participação na população nascida no Brasil. Em São Gonçalo, a razão mestiços/negros no caso dos cativos nascidos no Brasil era de 0,46. Em Nossa Senhora do Monte, alcançava 0,23. Assim, a população escrava de São Gonçalo era duas vezes mais propensa a conter mestiços que a outra. Segundo os dados de escravos inventariados de Parés (2007, p. 66), referentes ao conjunto da vila de São Francisco, essa razão passou de 0,34 em 1750-1779 para 0,41 em 1780-1800 e para 0,47 em 1801-1820, de modo que São Gonçalo parece ter sido mais representativo do conjunto de São Francisco que N. S. do Monte. Tudo caminha na direção de mostrar um contingente cativo, na paróquia da vila, que ainda retinha os caracteres que a antiguidade lhe tinha imprimido.
            Os dados de Parés mostram, além do mais, o processo de maturação da população escrava, com o crescimento contínuo da parcela mestiça em seu interior. Mas considerar as condições novas do início do século XIX impõe acréscimos. Já ficou sugerido em estudos comparativos que, sem eliminar a cumulatividade da presença de mestiços em populações escravas locais, a classificação de cada cativo como mestiço (pardo, mulato, cabra) ou negro era objeto de uma série de manipulações, de critérios arbitrários quanto aos fenótipos, mas motivados quanto às relações sociais de domínio, exprimindo uma espécie de ansiedade por estabelecer coesão (LIMA, 2015). Observem-se, na tabela 2, as razões entre os números de mestiços e negros entre escravos crioulos conforme o gênero e a idade. Ela tem uma seção específica para uma questão que só pode ser abordada quanto a São Gonçalo.
Tabela 2
Razão mestiços/negros entre escravos nascidos no Brasil de acordo com o gênero e a idade (São Francisco do Conde, 1811-1854)

Crianças
Adultos

Masculino
Feminino
Masculino
Feminino
São Gonçalo, 1811-1854
0,41
0,53
0,43
0,44
N. S. do Monte, 1822-1854
0,15
0,18
0,37
0,36
Evolução da razão mestiços/negros em São Gonçalo, 1811-1854

Crianças
Adultos

Masculino
Feminino
Masculino
Feminino
1811-21
0,40
0,53
0,48
0,65
1822-29
0,68
1,63
0,67
0,58
1830-39
0,43
0,41
0,50
0,56
1840-49
0,35
0,24
0,38
0,14
1850-54
0,23
0,40
0,17
0,13
Fontes: SG-1810-1849; SG-1849-1877; MO-1821-1852; MO-1852-1862.
Quanto a todos os grupos de gênero e idade, percebe-se uma espécie de comemoração mestiça da Independência (e do auge do tráfico de escravos). A propensão a ver mestiços cresceu até a década de 1820. Depois decresceu consistentemente. O parafuso foi apertado quanto à cor a partir de 1830, de modo que a tendência a que aparecessem mestiços entre os crioulos foi, no início dos anos 1850, quatro vezes menor que a observada no auge dos anos 1820. Esses movimentos, bruscos demais, só podem ter sido causados por mudanças nas grades de classificação. Aparentemente, se estava diante de uma aposta nas crianças mestiças, especialmente nas meninas mestiças. Quanto mais o tempo passava, tanto mais os rótulos de mestiçagem eram reservados às crianças. Mas até no caso delas o impulso pós-1830 foi de redução da importância da atribuição de mestiçagem.
Lembra-se a possibilidade de que a mestiçagem entre os crioulos tenha decrescido na época em função de enorme disponibilidade de parceiros endogâmicos negros, devendo-se isso ao auge do tráfico de escravos. No entanto, não se deve deixar passar o fato de que a participação de mestiços entre as crianças decresceu exatamente na paróquia – São Gonçalo – onde a presença africana foi decrescente após 1830. Assim, o mais provável ter havido mudança não nas estratégias matrimoniais, mas, antes, nos critérios de classificação, quase certamente como produto da turbulência política (MATTOS, 1995, p. 84-88; LARA, 2007, p. 131, 272-285).
No mínimo em Nossa Senhora do Monte, a imagem obtida sobre a composição da população escrava reitera aquela de uma onda de expansão disruptiva varrendo terras antigas. Essa imagem fica reiterada ao se observarem os africanos das duas freguesias.
Africanos em São Francisco do Conde
            Vale a pena buscar uma percepção mais dinâmica a respeito da presença de africanos entre os escravos das duas freguesias. Para isso, observa-se no gráfico 3 a participação dos óbitos de africanos no total de óbitos dos escravos adultos.
            A participação africana na população adulta era muito alta, embora se deva lembrar que os provenientes da África estivam sobrerrepresentados nos óbitos de adultos, em razão da mortalidade. Talvez por isso o resultado das duas paróquias aponte para mais africanos entre os adultos que o observado por Parés (2005, p. 111) para o intervalo 1750-1800, já que ele contou registros de escravos vivos, chegando a 59,8% dos adultos. Leve-se em consideração também que os números aqui obtidos não podem ser aproximados àquilo que os historiadores costumam chamar de taxa de africanidade, pois esta, além de levar em conta a população viva, confronta o número de africanos com o total da população, incluindo as crianças.
Gráfico 3

Fontes: SG-1810-1849; SG-1849-1877; MO-1821-1852; MO-1852-1862.
            Além disso, é notável que a presença relativa dos nascidos no Velho Mundo estivesse se reduzindo em São Gonçalo enquanto tendia a aumentar ou a manter-se em N. S. do Monte. Isso significa que o desempenho mais crescente da segunda foi alcançado mediante aquisições de escravos contrabandeados, denotando compromisso incontornável com o tráfico e falta de alternativas. No entanto, mesmo a mera preservação da escravidão cada vez mais desigual observada em São Gonçalo demandou aquisições, apesar de elas não parecerem ter preservado seu volume.
            Também se esperava que as africanas fossem menos frequentes entre as mulheres que os africanos entre os homens. O gráfico não mostra isso, então acrescente-se: a participação africana nos óbitos de homens em São Gonçalo foi de 77%, número que entre as mulheres alcançou 60%. Em N. S. do Monte as participações foram semelhantes: os africanos foram 80% dos adultos e as africanas foram 61% das adultas.
            Abordam-se agora as grandes áreas de procedência. Para examiná-lo, é preciso levar em consideração o fato de que, em certas épocas, os responsáveis pelo registro dos óbitos em São Gonçalo e Nossa Senhora do Monte assentavam os de africanos sem reportar uma área de origem, preferindo, para desprazer do analista, escrever “africano”, o clássico “de nação” ou assemelhados. Assim, é preciso abordar a identificação de grandes regiões de origem de duas maneiras. Uma delas é selecionar anos inteiros em que essas expressões dúbias não apareciam. A outra é selecionar, nos outros anos, meses inteiros durante os quais a expressão também não aparecia (tabela 3).
            Reitera-se o conhecido predomínio de africanos ocidentais, embora, como já foi estudado, a participação de provenientes da África Central Atlântica tenha tido alguma importância. Assim, em São Gonçalo, ela alcançava cerca de um terço dos africanos. Em Nossa Senhora do Monte, com suas escravarias aparentemente bem maiores e com todos aqueles barões, ficava ao redor de um quinto.
Este patamar aproximava-se bastante do que Andrade (1988, p. 98-104) estabeleceu para Salvador. Quanto a São Francisco e o Recôncavo, Parés (2007, p. 66) estimou, entre os africanos, 42% de centro-ocidentais entre 1750 e 1779, 36% entre 1781 e 1800, e 27%, entre 1801 e 1820. Reunindo São Francisco e Santo Amaro, apontou para centro-ocidentais representando pouco menos de um quinto dos africanos (PARÉS, 2005, p. 107, 111). Essa ordem de grandeza também se percebe na avaliação feita por Verger (1987, p. 670-675) a partir das partilhas de São Francisco do Conde (1729-1841): africanos centro-ocidentais representaram 21% dos africanos registrados, proporção que caiu a partir de 1821. Schwartz (1988, p. 285), estimando desembarques de africanos, estimou centro-ocidentais como 28% do total em 1803-1807 e 6% dos africanos desembarcados em 1809 e 1810.

Tabela 3
Procedências africanas de escravos e libertos na freguesia de São Gonçalo (1811-1854) – % do total de óbitos de africanos

São Gonçalo
N. S. do Monte




1811-1812 e 1814
1813-1854* - meses selecionados
1816-1834**
1832-1854 - meses selecionados
Nagô
19,0
22,0
28,0
47,9
Tapa
1,6
1,3
3,2
1,9
Borno
-
-
1,1
-
Barba
-
-
1,1
0,8
Ussá
6,3
7,5
14,0
7,3
Cotocori
-
-
-
0,4
Calabar
-
1,3
-
1,1
Camaraí
-
0,6
-
-
Benim
1,6
1,9
-
-
Gege
31,7
25,2
12,9
13,8
Mina
3,2
3,8
14,0
5,0

África Ocidental

63,4
(40)

63,6
(101)

74,3
(69)

78,2
(204)
Angola
34,9
28,3
11,8
9,6
São Tomé
-
0,6
1,1
-
Benguela
-
1,9
1,1
-
Congo
-
1,9
2,2
0,8
Cabinda
-
1,9
7,5
10,3

África Central Atlântica

34,9
(22)

34,6
(55)

23,7
(22)

20,7
(54)
Moçambique
-
1,3
-
1,1

África Oriental

-
-

1,3
(2)

-
-

1,1
(3)
Ilegível
1,7
-
2,0
-
Ignora-se nação

-

0,5

-

-

Total
(63)
100
(159)
100
(93)
100
(261)
100
* Exceto 1814.
** Exceto 1832.
Fontes: SG-1810-1849; SG-1849-1877; MO-1821-1852; MO-1852-1862.

            A importância dos africanos centro-ocidentais em São Gonçalo relacionou-se ao tom menos “sanguíneo” visto acima quanto à posse de escravos na paróquia da vila, pois em geral eram pagos por africanos ocidentais preços mais altos que por centro-ocidentais. Ao utilizar uma amostra ruim quanto a escravos do sexo masculino – e ela é ruim por ser falha quanto a indicar a idade, as condições físicas e as eventuais qualificações ocupacionais dos cativos –, obteve-se para 53 africanos ocidentais inventariados entre 1770 e 1807 em São Francisco do Conde o preço médio de 88$774, enquanto, para 105 africanos ocidentais, essa avaliação média ficou em 97$762. Quanto a africanas, as ocidentais eram 13% mais caras que as procedentes da África Central-Atlântica na mesma época (89$245 e 79$313, respectivamente). Entre 1808 e 1839, é possível que tenha se ampliado essa diferença na direção de preços mais elevados para os africanos ocidentais. 280 destes últimos teriam tido preço médio de 50 libras, resultando pouco menos que 40 libras para 43 homens provenientes da África Central Atlântica. A disparidade entre as médias aponta, portanto, para ocidentais quase 26% mais caros que angolanos e congoleses. A diferença, no que toca aos preços médios das mulheres dos dois tipos de procedência, diminuiu um pouco em relação ao intervalo anterior, pois ficou em 8,8%.[8]

Essa diferença de preços quase certamente se devia à expectativa de maior longevidade dos ocidentais, confrontada com o resultado cumulativo das persistentes crises de origem ambiental enfrentadas por angolanos (MILLER, 1989). Uma amostra com anúncios de jornal baianos (fugas e vendas) permite associar, qualitativa e impressionisticamente, africanos ocidentais a estaturas mais elevadas. Realiza-se uma aproximação a isso levando em conta um jornal soteropolitano, o Correio Mercantil,[9] onde se coletou uma amostra de anúncios publicados entre abril e novembro de 1838. Referem-se aqui impressões dos contemporâneos, não havendo como pesquisar estaturas efetivamente medidas. Mas a rica bibliografia a respeito da altura de escravos no passado permite associar altura e saúde comparativa e, portanto, longevidade, supondo uma correlação positiva entre as duas coisas (ELTIS, 1982, por exemplo).

O tom dos anúncios sugere que os contemporâneos valorizavam muito a altura de seus escravos. Além disso, a qualificação de escravos como “altos” parecia incidir com preferência em africanos ocidentais. Foram observados 87 anúncios em que a altura dos escravos foi comunicada. Entre os 22 homens africanos ocidentais, apenas cinco foram descritos como baixos. De altura regular, proporcionada ou ordinária eram dez. Altos eram os restantes 7. Quando se tratava de africanos centro-ocidentais do sexo masculino, baixos ou “um pouco baixos” eram 16. Ordinários, proporcionais ou regulares foram 4. Altos, apenas 3. Havia mais ocidentais altos que baixos. Quanto aos centro-ocidentais, havia bem mais baixos do que altos. Isso quanto a homens.
No tocante às 13 escravas vindas da África Ocidental, duas eram baixas, 8 eram de altura considerada mediana e 3 eram altas ou muito altas. Já entre as centro-ocidentais, uma era alta, três de altura ordinária ou regular e apenas uma alta. Dava-se o mesmo: era maior a propensão a encontrar altura entre aquelas que houvessem nascido na África Ocidental, ocorrendo o inverso no que tocasse às centro-ocidentais.
A presença e a evolução da família escrava
            A importância e o reconhecimento institucional da família escrava (ou a falta do segundo) em São Francisco do Conde é inicialmente abordada aqui examinando o caso dos escravos mortos com, no mínimo, 60 anos de idade, ou então o dos designados como “velhos”, “idosos” etc., ou ainda o dos escravos falecidos dos “achaques da velhice”. Esses números relativos a idosos, embora não devam ser confundidos com o celibato definitivo, se parecem com ele (tabela 4).
Tabela 4
Status conjugal ao morrer dos escravos idosos das freguesias de São Gonçalo e de Nossa Senhora do Monte (São Francisco do Conde, 1811-1854)

São Gonçalo, 1811-1854
N. S. do Monte, 1818-1854

Homens
Mulheres
Homens
Mulheres
Solteiros ou s/ inf.
54
33
83
44
Casados ou viúvos
5
4
17
18
Total
59
37
100
62
% celibatários
91,5%
89,2%
83,0%
71,0%
Fontes: SG-1810-1849; SG-1849-1877; MO-1821-1852; MO-1852-1862.
A quantidade de celibatários era aflitivamente alta, fazendo pensar em grande isolamento dos idosos. Por outro lado, o tamanho maior das escravarias de Nossa Senhora do Monte fez sentir seus efeitos: a participação dos solteiros era um pouco menor ali, embora ainda fosse gigantesca. Nos dois locais, a situação das mulheres era um pouco menos violenta que a masculina.
Avalia-se agora a evolução das chances de que africanos e crioulos adultos de qualquer idade tivessem, ao morrer, seu estado conjugal sancionado (tabela 5). Mantenha-se em mente que a importância dos laços sancionados decresceu durante o segundo quarto do século XIX (SLENES, 1999; LIMA, 2016).





Tabela 5
Escravos alguma vez casados – participação nos óbitos de escravos adultos conforme o sexo e a procedência (São Francisco do Conde, 1811-1854)

São Gonçalo, 1811-1854

Africanos
Crioulos

Homens
Mulheres
Homens
Mulheres




n.
% alguma vez casados



n.
% alguma vez casadas



n.
% alguma vez casados



n.
% alguma vez casadas
1811-25
174
9,8
91
11,0
34
14,7
49
8,2
1826-40
95
5,3
39
5,1
36
5,6
29
3,4
1841-54
52
7,7
22
12,0
27
3,7
25
-
Total
321
8,1
152
9,9
97
8,2
103
4,9

Nossa Senhora do Monte, 1818-1854

Africanos
Crioulos

Homens
Mulheres
Homens
Mulheres




n.
% alguma vez casados



n.
% alguma vez casadas



n.
% alguma vez casados



n.
% alguma vez casadas
1818-29
32
9,4
10
10,0
7
-
15
13,3
1830-41
195
2,6
73
23,3
44
9,1
39
15,4
1842-54
221
12,2
94
24,5
58
10,3
61
6,6
Total
448
7,8
177
23,2
109
9,2
115
10,4
Fontes: MO-1821-1852; MO-1852-1862; SG-1810-1849; SG-1849-1877.
A participação dos alguma vez casados era muito pequena. Além disso, é quase inacreditável que as situações respectivas de homens e mulheres não diferissem muito entre si. As percentagens podiam ser maiores entre as africanas e crioulas, é verdade, mas, além de nem sempre terem sido maiores, às vezes podiam até ser muito mais diminutas. Talvez tão surpreendente seja o fato de a situação dos crioulos não ter sido muito diferente da dos africanos (a das crioulas era ainda pior que a das africanas).
Os resultados globais chegaram a ficar piores, quanto ao acesso ao casamento, que os computados por Parés para os escravos adultos inventariados de São Francisco e Santo Amaro durante a segunda metade do século XVIII. Nessa época, pouco mais que dez por cento daqueles homens e mulheres eram casados. Nas paróquias aqui analisadas, e à exceção das mulheres africanas de Nossa Senhora do Monte, os óbitos indicam um pouco menos que 10% de alguma vez casados entre os escravos adultos. Parés também não achou as chances de legitimação das uniões de crioulos expressivamente maiores que as de nascidos no Velho Mundo (PARÉS, 2005, p. 111).
            Uma aproximação às taxas de ilegitimidade das crianças escravas permite retomar o problema. Nesse caso, consideram-se as informações sobre filiação presentes nos óbitos das crianças que faleceram com menos de quinze anos de idade (tabela 6).
Tabela 6
Ilegitimidade das crianças escravas falecidas (1811-1854)

São Gonçalo
N. S. do Monte

Nas grandes escravarias
Nos outros plantéis
Nas grandes escravarias
Nos outros plantéis
1811-15
100,0
91,7
-
-
1816-20
80,0
100,0
100,0
-
1821-25
92,9
87,0
100,0
100,0
1826-30
73,7
100,0
83,3
100,0
1831-35
88,9
100,0
83,3
100,0
1836-40
100,0
100,0
58,8
90,0
1841-45
100,0
100,0
83,3
95,8
1846-50
100,0
100,0
76,7
100,0
1851-54
100,0
100,0
87,3
100,0
Fontes: SG-1810-1849; SG-1849-1877; MO-1821-1852; MO-1852-1862.
            Realmente impressiona a persistência dos 100% de ilegitimidade. Além disso, esta última era maior nas escravarias que pareciam ser menores, conforme indicações presentes na historiografia. Mas as informações fornecidas por esses registros de óbito de São Gonçalo apontam para taxas obscenamente altas em qualquer tipo de plantel. Como a família escrava representava alguma forma de pacificação do cativeiro (FLORENTINO; GÓES, 1997), levar em conta sua clandestinidade no Recôncavo do período talvez ajude a compreender a ebulição vigente entre os cativos baianos, ao lado das oscilações produtivas e das candentes condições políticas da África Ocidental. As famílias existiam, pois de outra forma não compreenderíamos a presença de crianças. Mas elas não eram asseguradas pelo contexto.
Por outro lado, será sempre possível apontar para relação de sentido inverso entre restrições à família e contexto turbulento. Pode-se pensar na centralidade das experiências obtidas nas situações de enfrentamento, de conflito desbragado. Especificamente no tocante à Bahia e a seus escravos, João José Reis e Eduardo Silva (1989, cap. 5) escreveram faz tempo sobre o “jogo duro do dois de julho” e sobre o pesado impacto da guerra de Independência na vida dos escravos baianos. Schwartz (1988), por outro lado, e tendo em vista já os anos 1790, referiu-se à vigência na Bahia de uma “guerra para acabar com a escravidão”. Mas vinha do século XVII, segundo Krause (2014, p. 206), a fragilidade das possibilidades de serem sancionadas as famílias escravas, pois ele notou taxas altíssimas de ilegitimidade nessa época. A melhor interpretação, portanto, vai da contribuição da ausência de reconhecimento das famílias para a turbulência política, e não o contrário.
            Schwartz apontou, para os anos 1780, taxas de ilegitimidade escrava situadas entre 66% a 73%. Schwartz (1988, p. 318), aliás, calculou a taxa da própria São Francisco quanto a 1816. Chegou aos nossos já conhecidos 100%.
            De fato, o parafuso quanto à família escrava foi afrouxado e depois apertado durante o período estudado. Em S. Gonçalo, a ilegitimidade cativa caiu durante os anos 1810 e 1820. Os anos 1830 fizeram tudo retornar aos 100%, tendo o movimento durado um pouco mais nas grandes escravarias. É possível que se tratasse de alguma iniciativa pacificadora do cativeiro, em meio à incrível turbulência que nesse mesmo intervalo atingia os escravos do Recôncavo. A época dos contrabandos pôs uma pá de cal nisso. Em N. S. do Monte, a redução discreta da ilegitimidade só começou nas maiores escravarias durante os anos 1830, após a onda de revoltas na área que abrangia São Francisco do Conde.[10] Mas o movimento reverteu já no início dos anos 1840, caminhando-se de volta, e rapidamente, para os velhos 100%.
            É possível que tenha havido um movimento consistente para mobilizar as virtualidades pacificadoras da família escrava em face das turbulências da virada do século XVIII para o seguinte. Isso se manifestou nas informações sobre a ilegitimidade das crianças cativas mortas. Mas a reversão das sociabilidades dos anos 1830 pôs tudo a perder, e o contexto escravista tornou a avançar ainda mais na direção da brutalidade.
            Quanto à influência do tamanho das escravarias na capacidade de legitimação das uniões, a historiografia sempre apontou correlação positiva. Isso foi observado aqui, no entanto sem exageros. Em São Gonçalo, a ilegitimidade nos plantéis menores alcançava absurdos 96,9%, enquanto nos maiores ela chegava a “apenas” 90,3%.
            Com suas escravarias bem maiores, os engenhos de Nossa Senhora do Monte abrigavam mais famílias sancionadas, o que se exprimiu em taxas de ilegitimidade um pouco menores (no total do percurso, 75,3%). Mas ainda assim a ilegitimidade era enorme. Isso combina bem com a forte tendência ao celibato definitivo entrevista acima (os idosos que morreram sem nunca terem se casado formalmente). De fato, o tamanho das escravarias mostrou a outros respeitos sua capacidade de explicar alguma coisa. Nas outras unidades de N. S. do Monte as taxas de ilegitimidade eram semelhantes às das escravarias análogas de São Gonçalo (em N. S. do Monte, 95,8%). Assim, o timing foi um pouco diferente, mas o sentido teve alguns parentescos com o que se viu quanto a São Gonçalo. A ilegitimidade de 100% apareceu nos dados dos grandes plantéis até 1829, manifestando-se naqueles das outras unidades até 1835. A partir de 1830, a taxa começou a cair nos grandes, voltando a subir a partir de 1842. Nas outras unidades, o 100% foi mais renitente, só tendo deixado de aparecer em 1836-1841.
            Em geral, era imensa a incidência da ilegitimidade no Recôncavo, se ela for comparada com aquela das áreas açucareiras do Sudeste também canavieiro da mesma época. Em Rio Claro, SP, a ilegitimidade escrava medida através dos registros de batismo ficou entre 21% e 29% nos anos 1830 e 1840. Em Limeira, que também transitou do açúcar ao café, a legitimidade escrava ficou entre 15% e 22% na mesma época. Em Santa Bárbara, ela passou de 22% para 25% no trânsito da década de 1830 para a subsequente, enquanto em Capivari ela foi de 18% nos anos 1820, de meros 11% entre 1831 e 1838 e de 20% de 1839 a 1850. Em Piracicaba, a ilegitimidade passou de 14% (anos 1830) para 21% (anos 1840). Assim, a época do tráfico ilegal, na área da cana paulista, foi de aumento da ilegitimidade, mas sempre dentro de patamares muito baixos (LIMA, 2016, p. 249). Isso é muito diferente do verificado por este e outros trabalhos na área canavieira baiana, além do fato de que, dentro de São Paulo, as áreas voltadas para o açúcar tinham taxas de ilegitimidade escrava tremendamente menores que as observadas em locais voltados para outras atividades, como o café, a produção de alimentos ou a criação de gado.
            É preciso, no entanto, refletir mais sobre a falta de reconhecimento das famílias. Reis (2003, p. 408), considerando a raridade dos registros de uniões sancionadas entre escravos e libertos africanos de Salvador, deu grande ênfase a seu desenraizamento, e assim a espécies de desincentivos culturais, étnicos e sociais a que surgisse uma vida familiar mais vibrante. Para tratar disso observo as alianças matrimoniais.
            Uma parte ao menos dessas famílias lograva sancionar as uniões que as constituíam. Conforme notou Parés (2005, p. 111-112), a composição étnica dessa parte institucionalizada da população era semelhante à da população adulta em seu conjunto, de modo a não haver muitos sinais de se ter tratado de um segmento destacado do contingente escravo, espécie de segmento ascendente, excessivamente inserido no mundo senhorial. Isso indica, ao mesmo tempo, que famílias escravas se ligavam a um ambiente regrado, dotado de uma lógica própria. Aqui se argumenta que a escolha de parceiros indicia a incidência desses regramentos, sugerindo também, à sua maneira, que os laços não sancionados eram importantes e, de alguma forma, regulares.
            Uma maneira de avaliá-lo quanto a escravos é observar os pais das crianças falecidas cujos óbitos contivessem os nomes de ambos (isto é, do pai e da mãe de cada um). Só se pode realizá-lo no tocante a Nossa Senhora do Monte, pois, diferentemente de São Gonçalo, os párocos daquela tinham tendência mais pronunciada a qualificar os pais de crianças. O objetivo é observar os diversos grupos étnicos e sociais a fim de verificar a importância da endogamia (tabela 7).
Tabela 7
Sobre endogamia escrava em N. S. do Monte, 1829-1854 – pais e mães de crianças falecidas

De cor parda
De cor cabra
De origem crioula
Africanos
Ocidentais
Centro-Ocidentais
N. de cônjuges
2
3
18
84
14
Endogâmicos
2
2
8
68
6
Fontes: MO-1821-1852; MO-1852-1862.

As maiores taxas de endogamia eram as dos africanos ocidentais. Pardos e cabras só pareceram endogâmicos porque sua presença entre os passíveis de estudo foi inteiramente negligenciável. Aqueles africanos eram, inclusive, o grupo mais representado nessa amostra cuja montagem era muito dependente do grau a que chegava a propensão do padre a reconhecer uma forma de identificação. Parés (2005, p. 114) indica situação semelhante: endogamia de africanos ocidentais e crioulos.
            De certa forma, esse caráter relativamente regrado – a endogamia – observado nas poucas uniões formalizadas de africanos ocidentais ajuda a entrever algo de que os historiadores sempre suspeitam: não se trata de ausência de família, mas sim de dificuldades para assegurá-la institucionalmente. Se a vida dos africanos ocidentais tinha a capacidade de regrar as poucas uniões formalizadas, isso fortalece muito a suposição de que essa mesma vida também era capaz de organizar a existência da parcela da comunidade que não tinha acesso à sanção eclesiástica. Só não pode é passar de suposição, já que poderia perfeitamente dar-se o caso de as regras serem outras, incluindo regulações impossíveis de capturar com os frágeis dados disponíveis. Mas a maior probabilidade é a de que o regramento fosse o referido – a endogamia de africanos ocidentais –, e esse tipo de condicionamento deixou pistas (não mais que isso, lembre-se) até nos dados aproximativos utilizados.
A endogamia dos da costa não condiz com hipóteses no sentido de que a formalização representaria alguma espécie de prêmio aos escravos móveis, desligados de suas comunidades de origem. Ela sussurra a respeito de solidariedades.
Considerações finais
            É difundida a expectativa de que o tempo – o aprofundamento e a maturação das comunidades escravas – levasse a uma condensação e a uma extensão dos laços entre cativos, o que se faria exprimir não só no reforço dessas ligações, mas também no seu reconhecimento pelas comunidades locais. Mas isso não se passava na parte estudada da Bahia, apesar de se tratar de uma das primeiras regiões escravistas estabelecidas na colônia. Nem a situação dos crioulos se destacava daquela dos africanos quanto a isso. Quase nenhuma união era reconhecida pela sociedade englobante.
            Paralelamente, entrevê-se terem tido vigência regras comunitárias, conforme a natureza das alianças matrimoniais que foram passíveis de reconstrução. Essa vigência sugere que a parte não sancionada da vida familiar cativa nem era desregrada, nem governada exclusivamente pela mobilidade ascendente.
            As mudanças causadas pela primeira proibição do tráfico de africanos foram sentidas pelos senhores de escravos. Muitos deixaram de sê-lo, ao passo que, pelo fato de as maiores unidades não terem deixado de crescer, ao menos em Nossa Senhora do Monte, aumentou muito a distância social entre a elite escravista e o conjunto dos homens e mulheres livres (sendo esse conjunto, no caso de São Francisco, em grande medida formado por descendentes livres e forros de escravos).
            Embora tenha reduzido seu ritmo ao redor de 1840, o crescimento dos grandes plantéis resistiu até mesmo a essa data, ao redor da qual se manifestou a tendência a que o crescimento da agroexportação açucareira baiana passasse a carecer de mercados no médio prazo. A clivagem de 1840 ligou-se, como em outras áreas açucareiras, à sedimentação do lugar de Cuba nesse tipo de mercado. O fato de se ter cavado o fosso que traria problemas de sustentação política para a escravidão e aquele de manifestar-se a promessa de ausência de mercados no médio prazo impedem o manejo tranquilo da noção de segunda escravidão para fazer referência à Bahia.
            Esse crescimento, onde ele ocorreu, fez-se com a preservação ou mesmo algum aumento, ao menos no início da ilegalidade, da proporção de africanos na população escrava. Isso pode ter resultado de aquisições realizadas ainda nos anos 1820, pois aqui foram computadas as mortes dos escravos. É possível, mas muitas mortes de africanos jovens conduzem a ter-se mais segurança quanto à hipótese de terem sido comuns as aquisições da época da ilegalidade. É importante notar também que, em algumas situações, aumentou a participação dos angolanos entre os africanos escravizados.
            A ilegalidade do tráfico africano introduziu distúrbio na posse de escravos, excluindo dela pequenos senhores, conforme se nota com a redução de seu número em São Gonçalo. Além disso, parece ter aumentado a desigualdade entre eles e a distância social dos mesmos frente aos outros homens e mulheres livres. Isso fica indicado com ainda mais força pela comparação dos destinos dos senhores de N. S. do Monte e de São Gonçalo. A época dos contrabandos, por fim, intensificou a circulação no Império das práticas destrutivas e violentas que vinham também de outras fontes, manifestando-se com força em deterioração ainda maior da vida dos escravos.

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[1] Não se considera a população escrava de 1872 para fazer sentir o tamanho de São Francisco por ser provável que esses contingentes já tivessem sido diminuídos pelo tráfico interno de escravos, de modo que populações cativas dessa época não retratam o peso específico do local. Recenseamento do Brazil em 1872 – Bahia, p. 143ss
[2] ELTIS, David et al. The Trans-Atlantic Slave Trade Database <http://www.slavevoyages.org/voyage/search>. Acesso em 29/11/2017.
[3] Notas e commentarios para a Historia da Agricultura na Bahia. Annaes do Archivo Publico e Museu do Estado da Bahia, Salvador, v. 14, 1925, p. 30; MATTOSO, 1992, p. 462.
[4] Resumo eficiente das discussões sobre Cuba está em TOMICH, 2011, p. 90, 106-115.
[5] Correio Mercantil, Salvador, n. 435, 03/04/1838.
[6] Açúcar bruto, para refino, e não mais o branco, que saía já acabado de pães de açúcar; ver BARICKMAN, 2003, p. 78-79; ver Caldeira Brant em busca de mestres jamaicanos na época da Independência (Economia açucareira do Brasil no séc. XIX. Cartas de Felisberto Caldeira Brant Pontes, Marquês de Barbacena. Rio de Janeiro: MIC/IAA, 1976, p. 107-110) e as recomendações em favor do bruto em O Auxiliador da Indústria Nacional. Rio de Janeiro: Seignot-Plancher, 1833, n. 3, p. 9.
[7] SCHWARTZ, 1988; TADMAN, 2000; considere-se igualmente a estimativa (FOGEL, 1989, p. 18) de que a maioria dos africanos traficados foram direcionados para áreas açucareiras.
[8] 43,2 libras para 153 ocidentais e 39,7 libras para 22 centro-ocidentais; cf. Livro de tutelas e inventários da vila de São Francisco do Conde. Anais do Arquivo Público da Bahia, Salvador, v. 37, p. 5-334, 1960.
[9] Ele está entre os jornais usados por REIS, 1999.
[10] Como se recorda, Reis (2003, p. 120) advertiu que a rebelião de 1835 não chegou ao Recôncavo, da mesma forma que Souza (1987) deixou claro ter sido a Sabinada um movimento mais urbano. Os registros paroquiais mencionam escravos soteropolitanos retirados ali em 1822 e 1823 (MO-1821-1836, sem paginação; SG-1810-1849, paginação ilegível. Mencionam também mulheres da elite refugiadas em São Francisco em função da Sabinada (SG-1810-1849, fl. 233).

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